Por Cristiani Plácida | Foto: arquivo pessoal

Depois de alguns dias, Ana levantou-se da cama, não sabe de onde veio aquela força, o importante é que estava de pé. Tomou um banho, trocou de roupa, desceu as escadas do prédio que morava e dirigiu-se a praia para caminhar e pensar sobre o que faria a partir de agora. Ela sabia que a decisão mais difícil havia sido tomada, estava longe de quem não merecia sua companhia, e mesmo que o preço fosse alto demais, estava confiante de que em breve estaria perto dos seus filhos e de sua mãe, era apenas uma questão de tempo e de ordenamento de pensamentos e emoções.

Ao caminhar pela praia, se deu conta de que precisava conversar com alguém, há algum tempo havia se fechado com vergonha do que estava vivendo, sabia que conversar lhe ajudava, permitia que entendesse melhor seus sentimentos, a questão é que suas últimas experiências foram tão negativas, que achou melhor calar-se, e todo aquele sentimento preso estava deixando-a sufocada e com a sensação de que poderia explodir a qualquer momento.

Eu digo que é sempre um desafio escrever sobre a Ana, pois ao mesmo tempo que falo sobre uma outra pessoa, tenho a sensação de que é alguém muito próxima, Ana se mistura com a história de tantas outras mulheres, que eu mesmo me confundo. Como sabemos, o casamento de Ana era tóxico, foi traída por mais de dez anos e sentia-se culpada por isso e por ser uma relação longa, a maioria dos amigos dela e do seu ex-marido, eram em comum, sendo quase impossível fazer um desabafo sem que virasse fofoca e motivo para mais uma briga.

Ser motivo de fofoca e exemplo de como não viver, já é mais que suficientes para alguém se fechar e se isolar, contudo, não parava por aí. Sempre que procurava uma amiga para conversar, logo era interrompida e passava a ouvir centenas de conselhos e receitas de uma vida conjugal maravilhosa. Isso a deixava irritada, confusa, mas estava tão “pequena” que não tinha coragem de dizer: Para, me deixa falar, preciso desabafar, não quero que resolva meus problemas, quero apenas ser ouvida, acolhida. Quero colo. Preciso de alguém que escute minhas dores e aflições e ao menos finja que entendeu, talvez assim eu consiga a força necessária para suportar essa vida ou vire a mesa e siga outro caminho. Essas palavras não foram ditas, ficaram presas em seus pensamentos, martelando, martelando.  

Quantas vezes eu e você também tivemos vontade de dizer essas mesmas palavras ou ainda, merecíamos ouvir de alguém? Conhecer a história de Ana, está me ajudado a enxergar muitos pontos importantes, que passavam desapercebidos e deixavam minha vida morna, sem graça e com poucos aprendizados.

Quando uma amiga nos procura para falar sobre suas experiências conflituosas, tomamos suas dores e então disparamos uma centena de conselhos, contamos histórias semelhantes, experiências vividas e não damos conta de que ela continua ali, diante de nós por pura educação, ou, falta de energia, se não lhe faltasse uma das duas, talvez nos mandaria aquele lugar. Isso porque ela não nos procurou para ouvir, nos procurou para falar. E do alto de nossa supercapacidade de resolver problemas sabemos exatamente o que deve ser feito e esquecemos que o mais importante em uma relação, é ouvir. Ao deixá-la desabafar, talvez desmorone de tanto chorar, não importa, porque naquele momento somos colo ou deveríamos ser.

Ser procurada por uma amiga é sinal de confiança, então, deixe-a falar, não interrompa, não julgue, não tome suas dores, tão pouco queira resolver os problemas dela. Ela confiou em você, sentiu segurança, te viu como boa ouvinte e sabe que tens condições de acolhê-la. Será através dessa relação de cumplicidade e acolhimento que a amiga conseguirá enxergar com mais clareza, ganhará a coragem para se refazer. Ela encontrará seu próprio caminho e em algum momento da vida também será o melhor lugar do mundo para alguém. Será a amiga capaz de ser colo.